É possível ser feliz hoje? 

É possível que o homem seja feliz em meio às  turbulências existenciais? Seligman e Csikszentmihalyi  (2000) enfatizam que a psicologia não é só o estudo da  patologia e da fraqueza, mas também o da força e da  virtude. Segundo eles, a felicidade é o maior objetivo da  vida humana. 

Na sociedade contemporânea existe a preocupação  em ter uma vida mais saudável em aspectos gerais, como  alcançar a realização pessoal baseada no amor, na gratidão  e em processos metafísicos, mas diferentemente disso,  algumas pessoas buscam a felicidade focando em objetivos  externos como dinheiro, fama e sucesso profissional. Os  prazeres imediatos obtidos na compulsão por substâncias  psicoativas, alimentação, comportamentos de risco não  contribuem para a felicidade, ao contrário, podem conduzir  a problemas sérios de saúde.

As ferramentas psicológicas ajudam o homem a  gerenciar a insatisfação, proporcionando resiliência,  inteligência emocional e reestruturação das crenças profundas, transformando-as em otimistas e proativas,  facilitando o desenvolvimento da espiritualidade e  humanidade. O trabalho pode ser uma alternativa  inteligente para se sentir feliz, segundo o pesquisador  Csikszentmihalyi, que criou o conceito de “fluxo” que  expressa um estado mental em que o indivíduo fica  completamente imerso, concentrado no que está fazendo,  derivando dela um grande prazer. (Csikszentmihalyi,  1990). 

Através da alimentação saudável, atividade física,  sono reparador e administração das emoções, uma melhor  qualidade de vida surge como uma possibilidade prática  diária. Ela passa a ser analisada como uma vertente  científica saindo dos padrões de crenças desde a  antiguidade, por uma narrativa fundamentada em  observações dos acontecimentos reais, buscando  constantemente alcançar essas sensações, seja por produtos, serviços, empregos, casa própria, filhos, ou  outras metas de vida “padronizadas” no imaginário social  (Brinkmann, 2017; Warren, 2009). 

Diante da pergunta “O que é felicidade para você”?  Observei que cada pessoa reagiu de uma maneira. Uma  começou a filosofar, outra começou a sorrir e dançar, outra  disse que iria pensar e outras resumidamente disseram ser estado de harmonia entre mente, espírito e corpo, deixar se fluir diante da paz interior. As respostas envolviam os  sentimentos e a subjetividade de cada um, uma em especial  foi de um senhor de quase oitenta anos, ao responder estar vivendo um estado de felicidade que já fazia um bom  tempo. Curiosamente, perguntei-lhe novamente e o que é  de tão especial que o Senhor faz para viver tal sentimento  nobre? Prontamente, ele respondeu, acordando às cinco da  manhã e plantando cebolinha no meu quintal. Isto fez-me  enxergar a importância das emoções positivas engajadas  com o propósito de vida. 

Muito se abordou sobre as mazelas psíquicas no  modelo biomédico, e esquecemos de apresentar na história da psiquiatria as virtuosidades humanas baseadas em  potencialidades. Na história da ciência da psicologia  existiu uma preocupação de alguns pesquisadores em  compreender o homem pelo aspecto positivo,  fundamentado no humanismo, entre eles se destacam Carl  Jung (1936/1969), Roberto Assagioli (1926), Abraham  Maslow (1954) e Carl Rogers (1959) no entanto, as suas  ideias não pareceram atrair para estudos de uma visão mais  positiva do ser humano (Paludo & Koller, 2007). 

O conceito de felicidade e bem-estar subjetivo,  segundo a OMS (1946), “o completo estado de bem-estar  físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de  enfermidade” (Preâmbulo da Constituição da OMS),  demonstra a importância de salientar o lado bom do ser  humano. O fato de vivenciar sentimentos negativos como  a tristeza, ansiedade, angústia ou raiva não significa  infelicidade, estes sentimentos em alguns momentos são  importantes como uma mola propulsora para o  desenvolvimento humano.

Quando partimos para uma análise baseada no  dicionário Houaiss (2009) da língua portuguesa, encontramos a definição: “1. Qualidade ou estado de feliz,  estado de uma consciência plenamente satisfeita,  satisfação, contentamento, bem-estar; 2. Boa fortuna,  sorte; 3. Bom êxito, acerto, sucesso” (p. 884).  

A nossa capacidade de se projetar fora de nós  mesmos, aceitando as nossas limitações em todos os  sentidos, assim como as nossas potencialidades, facilita o  encontro com as pessoas no exercício espontâneo de  vivenciar as emoções positivas, resultados da nossa  liberdade perceptiva fundamenta nos aspectos subjetivos.  Existe a necessidade de mais estudos para  compreendermos porque algumas pessoas, mesmo diante  dos acontecimentos caóticos, possuem um senso de  transcendência para outros estados de virtuosidade e  equilíbrio, superando adversidades. O fato é que entender  por que uma pessoa sente um ataque de pânico no conforto  do seu quarto e outra, mesmo vindo, no final de tarde, de  uma instituição de trabalho, com um clima interpessoal altamente hostil, mantém o seu controle pessoal, o bom  humor e perspectiva de uma vida saudável e feliz. 

Existe fórmula de felicidade? Encontraremos em  diferenças de gêneros, poder político ou financeiro, idade,  música? Contemplação? Alegria? Nos filmes? Nos  amigos? Livros? Na família? Filosofia? Religião? No  esporte? No orgasmo? Nas artes? No acúmulo de bens  materiais? No trabalho? Lazer? Na família? Nas relações  humanas? No posicionamento interpessoal de forma  extrovertida? 

“A moral, propriamente dita, não é a doutrina que nos ensina como  sermos felizes, mas como devemos tornar-nos dignos da felicidade”.  Immanuel Kant 

A teoria de Seligman e Csikszentmihaly (2000),  recebeu o nome de Psicologia Positiva e dedica-se a  estudar os estados afetivos e as virtudes positivas, como a  felicidade, a resiliência, o otimismo e a gratidão. Foi  desenvolvida a partir da década de 1990 e investiga os  sentimentos, as emoções, as instituições (como a família,  escolas, comunidades e a sociedade em geral) e os comportamentos positivos que têm como finalidade a  felicidade humana. (Seligman, 2000). 

Menciono o filósofo Kant, quando afirma que a  felicidade é a capacidade cognitiva para o homem pensar  o mundo segundo a sua vontade e desejos. A pensadora  Hannah Arendt alegou a importância da participação na  vida pública com liberdade, agindo nela. Einstein  reforçava a ideia de uma vida calma e simples, contrária a uma vida ambiciosa em busca do reconhecimento, o que  poderia causar angústia. Para Nietzsche, a felicidade é  passageira e é importante a contemplação, a imaginação e  se alegrar com as pessoas. O escritor e psicanalista Freud alega que o homem busca freneticamente a felicidade e que  não poderá ser encontrada no mundo real, pois a frustração  sempre estará presente e, a felicidade poderá ser no  máximo parcial. 

O sentido de viver proporciona razões para pensar  em realizações futuras, sejam elas de trabalho, relações  afetivas ou o que a vida espera de nós, dizia o psiquiatra e  psicólogo Viktor Frankl. A busca de sentido da vida é um processo natural no contexto da liberdade humana.  Podemos escolher como pensar e sentir as nossas  dificuldades, mesmo diante da dor. Não procuramos a  felicidade, mas a razão para ser feliz. 

Quando procuro o que há de fundamental em mim, é o gosto da  felicidade que eu encontro. Albert Camus 

Considerações finais 

 Percebe-se que o assunto felicidade é subjetivo,  requerendo mais estudos das ciências da psicologia,  extrapolando os muros das doenças mentais. Os  componentes da personalidade, dos traços e temperamento  diferem de indivíduo para indivíduo e o conceito poderá  mudar conforme o lugar e a época estudada. Atualmente a  Psicologia Positiva está voltada para o assunto, como  ajudar as pessoas, as comunidades, as instituições de  trabalho a desenvolverem as potências humanas baseadas  nas virtudes, conseguindo caminho de promoção da saúde  mental para toda a população. Faz-se necessário a reflexão sobre as prioridades, valorizando as demandas internas e  externas com vistas ao equilíbrio e à satisfação de viver. 

Portanto, concluo, pelo exposto, que a felicidade é  específica de cada ser humano e sempre buscará as suas  respostas para os acontecimentos da vida pessoal, de  trabalho, social e familiar. E para você, o que é felicidade? 

Como você faz para alcançá-la? 

Referências 

Brinkmann, S. (2017). Stand Firm: Resisting the self improvement craze. UK: Csikszentmihalyi, M. – Flow: the psychology of optimal  experience. HarperCollins Publishers, New York, 1990 

Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa. São Paulo: Objetiva, 2009. FIGUEIREDO, C. Paludo, S. S. & Koller, S. H. (2007) Psicologia Positiva:  uma nova abordagem para antigas questões. Paideia,  17(36): 09-20. 

Seligman, M. E. P. & Csikszentmihalyi, M. (2000)  Positive Psychology: An introduction. American  Psychologist Association. Jan. 55(1): 5-14. 

Adriano Nicolau da Silva, Psicoterapeuta, Neuropsicopedagogo e Neuroeducador. Graduado em Psicologia e Filosofia. Especialista nas áreas de educação e clínica. Uberaba, MG. E-mail: adrins@terra.com.br. Colunista do Factótum Cultural.