Por Adriano Nicolau da Silva

Observa-se, na atualidade, um movimento crescente de indivíduos em busca de um propósito existencial. Contudo, essa busca, frequentemente, manifesta-se como uma corrida incessante por resultados imediatos, concentrada na satisfação de demandas efêmeras, sejam elas de ordem intelectual ou ligadas ao prazer sensorial. A confusão emerge quando a percepção é restringida a uma única via de sucesso e realização pessoal, a qualquer custo.
A negligência da cognição no processamento e reflexão sobre as emoções acarreta um preço elevado, buscando por um alto padrão de consumo ou pela manutenção de um status social narcisista tem contribuído para o adoecimento mental, manifestando-se em transtornos como ansiedade, estresse, depressão e burnout, além de problemas metabólicos como obesidade e hipertensão.
Eysenck, Derakshan, Santos e Calvo (2007), demonstram como a ansiedade pode comprometer a capacidade e o controle cognitivo, desviando recursos mentais para pensamentos intrusivos em detrimento do foco na tarefa em questão. Esse ciclo vicioso de desempenho prejudicado e aumento do estresse, decorrente da má gestão da ansiedade, impacta negativamente a qualidade de vida.
Nesse contexto, a busca por uma vida com propósito e significado se configura como uma jornada fundamental da experiência humana. A cognição, entendida como o conjunto de processos de aquisição, organização e utilização do conhecimento, torna-se um pilar essencial. A psicologia cognitiva, impulsionada por contribuições de autores como Michael W. Eysenck, Ulric Neisser e Robert J. Sternberg, oferece uma perspectiva valiosa sobre como a inteligência pode ser utilizada não somente para resolver problemas cotidianos, mas também para construir uma existência mais rica e significativa.
Michael Eysenck (2009) enfatiza a importância de compreender os processos mentais subjacentes ao comportamento humano, argumentando como a mente opera, desde a atenção seletiva até a memória de longo prazo, é crucial para moldar nossas percepções e decisões. Ao internalizarmos esse entendimento, podemos direcionar nossa inteligência para refletir sobre nossos valores e objetivos, em vez de somente reagir a estímulos externos. A inteligência cognitiva permite discernir o que é intrinsecamente importante, filtrando o “ruído” da vida moderna e focando em ações alinhadas com nossos propósitos mais profundos.
Ulric Neisser (1967), pioneiro da psicologia cognitiva, propôs que a mente humana não opera isoladamente do ambiente. A percepção e o pensamento são processos dinâmicos e construtivos, nos quais a mente e o mundo externo se influenciam mutuamente. Essa visão sugere que a busca por sentido na vida é um processo de interação contínua, e não uma tarefa passiva. Nesse contexto, a inteligência é a ferramenta que nos capacita a construir ativamente uma existência significativa, engajando-nos com o mundo de maneira deliberada e intencional. Assim, o sentido não é nada a ser descoberto, mas sim criado por meio de nossas interações e escolhas cognitivas.
A perspectiva de Sternberg (1985) encontra um ponto de confluência com a psicologia positiva, especialmente com a proposta de Martin Seligman (2011). Seligman defende que a felicidade e o bem-estar genuínos são compostos por três elementos principais: prazer, engajamento e significado. A inteligência, sob a ótica de Sternberg, emerge como um recurso fundamental para alcançar cada um desses pilares. A inteligência analítica permite discernir as fontes de prazer e propósito, enquanto as inteligência criativa e prática são essenciais para buscar o engajamento em atividades desafiadoras e para construir um sentido de vida ao aplicar nossos talentos em algo maior do que nós mesmos
A psicologia cognitiva, ao investigar o uso da inteligência, encontra ressonância no conceito de felicidade, proposto por Martin Seligman (2011). Seligman desmembra a felicidade em três componentes interligados, que podem ser vistos como pilares para a construção de uma vida plena: prazer, engajamento e significado. A inteligência, como entendida pelos psicólogos cognitivos, pode ser a bússola que nos guia na busca e cultivo de cada um desses pilares. O prazer é o componente hedônico da felicidade, relacionado a experiências sensoriais e emocionais positivas. Embora a busca por prazer seja importante, a inteligência cognitiva permite ir além da gratificação instantânea. Em vez de apenas reagir a estímulos prazerosos, podemos utilizar a inteligência para planejar e antecipar experiências que nos tragam alegria duradoura, como uma viagem ou um reencontro com amigos. O engajamento, por sua vez, refere-se ao estado de “fluxo”, onde estamos completamente imersos e absortos em uma atividade.
A visão de Neisser (1967) sobre a cognição como um processo de interação ativa com o ambiente torna-se central nesse ponto. A inteligência nos permite identificar nossas forças e talentos, e nos engajar em atividades que nos desafiam na medida certa, criando esse estado de profunda imersão e satisfação. Seja no trabalho, em um hobby ou em um esporte, é a aplicação prática e criativa da inteligência que nos permite encontrar e sustentar esse estado de fluxo.
Nesse sentido, o significado é o pilar mais elevado da felicidade, alcançado quando utilizamos nossos talentos e forças para servir a algo maior do que nós mesmos. A teoria triárquica da inteligência de Sternberg (1985) se alinha perfeitamente com esse conceito. A inteligência analítica nos ajuda a refletir sobre nossos valores mais profundos e o que é verdadeiramente importante. A inteligência criativa nos capacita a encontrar novas maneiras de contribuir para a sociedade ou para uma causa que nos é cara. E, finalmente, a inteligência prática nos permite aplicar essa reflexão e criatividade na realidade, transformando nossos ideais em ações concretas que geram um senso de propósito e pertencimento.
Portanto, a psicologia cognitiva e a psicologia positiva, embora campos distintos, oferecem uma visão complementar da busca por uma vida com sentido. A inteligência, como vista por Eysenck (2009), Neisser (1967) e Sternberg (1985), não é apenas uma medida de capacidade, mas uma ferramenta para navegar pelos componentes do prazer, engajamento e significado propostos por Seligman (2011). Ao aplicar nossas capacidades mentais de forma consciente e intencional, podemos transformar a busca por sentido em uma jornada ativa, criando uma existência inteligente, mas também profundamente feliz e significativa.
Conclui-se, portanto, que o indivíduo pode encontrar seu próprio espaço no mundo ao desenvolver suas virtudes através do treinamento mental e emocional, impulsionado pelo comportamento intencional. Evidências científicas demonstram que a felicidade não depende da acumulação de bens materiais, mas sim do direcionamento da energia psíquica para a reflexão sobre o que realmente se deseja, preparando-se para as respostas a curto e longo prazo, e agindo com a devida cautela para alcançar os objetivos almejados.
Referências Bibliográficas
EYSENCK, M. W. Fundamentals of Cognition. New York: Psychology Press, 2009.
EYSENCK, M. W.; DERAKSHAN, N.; SANTOS, R.; CALVO, M. G. Anxiety and cognitive performance: the attention control theory. Emotion, Washington, D.C., v. 7, n. 2, p. 336-353, 2007.
NEISSER, U. Cognitive Psychology. New York: Appleton-Century-Crofts, 1967.
SELIGMAN, M. E. P. Flourish: a visionary new understanding of happiness and well-being. New York: Free Press, 2011.
STERNBERG, R. J. Beyond IQ: a triarchic theory of human intelligence. Cambridge: Cambridge University Press, 1985.

Adriano Nicolau da Silva, Psicoterapeuta, Neuropsicopedagogo e Neuroeducador. Graduado em Psicologia e Filosofia. Especialista nas áreas de educação e clínica. Uberaba, MG. Colunista do Factótum Cultural. E-mail: adrins@terra.com.br
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