Aqui está o tio Jocy com seu incenso aceso em vão, protestando ao meu lado no apocalipse reborn

Mulher compra bebê reborn e faz chá de fraldas. Marido pensa em pedir divórcio, mas tem medo de deixar a guarda da boneca com ela.

Sim, era uma vez o útero. Mas hoje temos a Amazon.

Por R$ 299,00, você compra um bebê reborn (renascido) com mais realismo do que o Congresso Nacional. Ele vem com cabelo humano, cheiro de talco, roupinha importada, enxoval e, se pagar mais R$ 20, ele chora — assim como você, quando vê a fatura parcelada em até 12 vezes de R$27,90 no cartão de débito.

E antes que você pense: ‘ah, é só um hobby inofensivo’, te aviso: o mercado movimenta milhares de reais, e alguns exemplares são vendidos como se fossem obras de arte — o que, tecnicamente, são. O preço do boneco pode chegar a R$ 9.500,00.

Tem gente que faz chá revelação, mas também tem festa de aniversário de reborn. Com bolo temático, balão de gás hélio e avó emocionada tirando foto. Tem gente que leva o boneco no carrinho até o shopping e discute com a atendente da estacionamento porque “esse menino tem direito ao leite especial SIM, senhora!”. Eles estão sendo levados no colo até a farmácia, com direito a: ‘bom dia, doutora!’. O bebê tem RG. CPF. Número do SUS. Direito ao Bolsa Família. Pode ser batizado. Tem que levar para tomar Sol no final de tarde. Tem que levar na igreja. Têm direito a assento preferencial no transporte público….

Logo, será inaugurada uma Clínica Reborn especializada em partos para mães de bebês reborn, no sul do país. Em 2026, maternidade e sala de aula de educação infantil só com bebê reborn (Jocy & Neyzinho Ltda). Sim, quando a sogra pergunta quando vem o neto, você mostra seu bebê reborn com CPF e tudo. E, se a tendência continuar, em breve vai votar, financiar um carro e fazer intercâmbio. A vidente já prevê que logo espíritos habitarão bebês reborn (sim, lembrei do Chuck).

A carência virou indústria. A solidão ganhou fralda. E a insanidade ganhou enxoval completo com etiqueta.

Essas ‘mães dedicadas’ não deram à luz — deram ao débito automático. E o pai? O pai evaporou. Foi buscar uma cerveja e nunca mais voltou depois que a esposa confessou estar com “depressão pós-parto do reborn”. Está em dúvida se está vivendo uma pegadinha ou um episódio da Black Mirror. Dizem que ele hoje vive com trauma em uma república de homens divorciados de bonecas. Mas tem medo de falar qualquer coisa: vai que ela pede pensão pra boneca?

Você pensa que é meme, até ver o perfil @MamaeDaAurorinha com 43 mil seguidores no Instagram (ou seja, com mais seguidores que você) e a seguinte postagem:

“Hoje nossa princesa completa 6 meses de muito amor! Cada dia mais esperta… ontem até fingiu que dormia enquanto a mamãe assistia novela!”

Programas e projetos de lei já estão surgindo. Na semana retrassada foi protocolado uma proposta de lei que preve a inclusão do “Dia da Cegonha” Reborn no calendário oficial do município do Rio de Janeiro. Outros dois projetos de lei sobre os bebês também foram protocolados por deputados estaduais do Rio e de Minas Gerais. Sorocaba lança programa para com bebês reborn.

E aí você percebe que o mundo acabou (e nem Jesuz quer voltar). Só esqueceram de desligar o wi-fi. Entre bonecas e boletos: onde foi que a humanidade errou?

Em algum momento, o espírito humano desistiu de tentar amar outros seres humanos e passou a amar um simulacro de bebê que nunca vai crescer, nunca vai bater a porta do quarto na sua cara, e jamais vai dizer ‘te odeio’ na puberdade. Um bebê reborn. Um amor reborn. Uma alma reborn. Tudo de mentira, mas com entrega expressa e rastreio.

No fundo, talvez seja isso que a gente queira: algo que possamos controlar, que nunca nos questione, que sorria eternamente com a boca pintada à mão. Um ser inofensivo e previsível, como todo desejo mal resolvido. E se for bonitinho, fotogênico e não te chamar de ‘pai ausente’, melhor ainda. Sim, também tem pai de reborn! Ah, e se você ficou com vontade de comprar um… talvez a pensão seja mais barata, tá bom?

E se houver divórcio?

Aí a coisa fica séria, aí o caldo entorna. E aqui, como advogado reborn, que entro em ação!

A psicanálise talvez explique, a sociologia talvez compreenda, mas o advogado agora acompanha os prazos no PJe.

Porque já tem gente brigando judicialmente por guarda de boneca após o divórcio. Embora também mãe de reborn pedindo um teste de DNA e exigindo pensão de ex. E também tem mulher pedindo pensão alimentícia pro boneco reborn — com cálculo baseado no preço do leite NAN, pacotes de lenço umedecido e consultas com pediatra imaginário. Em audiência, muitos advogados perdem a fé (mas eu vou pagar meus boletos vibracionais):

“Excelência, meu cliente não quer mais arcar com as despesas da boneca.”
“Mas a genitora alega que o reborn está com problemas respiratórios e precisa de bombinha de asma.”
“Requeremos perícia no pulmão de borracha da menor, que segundo consta, apresenta chiado.”

Nesse ponto, o juiz, já sem fé na humanidade, suspira. E sentencia:

“Fica fixada guarda compartilhada e visitas quinzenais. Pensão: um salário-mínimo e meio, com reajuste anual conforme índice da inflação das fraldas, a ser depositado na conta da Barbie responsável.”


Consigne-se, por fim, que nossa advocacia está espiritualmente preparada para atuar nesses casos com seriedade, sigilo e empatia — mesmo quando a criança é feita de vinil e a disputa envolve quem fica com o bercinho rosa com rodinhas cromadas.

Serviços que oferecemos:

  • Adoção de Reborn com Inteligência Artificial;
  • Uniões Homoafetivas com Hologramas;
  • Alienação Parental Energética;
  • Processo de Reparação por Encosto;
  • Inventário de Bens Virtuais;
  • E também Impetramos Habeas Corpus em Favor de Alma Aprisionada no Corpo de Reborn desde 2025. Impetrado por consciência desperta após cerimônia de Ayahuasca.

Como advogado, dizemos não a intolerância materna!

A Justiça pode até estar cega, mas aqui a gente faz ela rir. Se você chegou até aqui, parabéns. Você acaba de testemunhar o nascimento da nova era do Direito: aquele que ri para não enlouquecer — e às vezes enlouquece para escrever melhor.

Cenários para 2026 … e nova pesquisa Datafolha aponta que Lula e Bolsonaro perderiam no 2º turno para um bebê reborn!


Não deixe de ler O Ego É um Estagiário Emocionado Tentando Ser Deus e Reborn: A Boneca que Chorava por Dentro (e o Que Isso Revela Sobre a Alma)


E toda segunda, nossa coluna “Escrever para Não Enlouquecer” traz humor para os dias difíceis. Sábado a gente fala sério — mas só porque o universo exige equilíbrio.


E sim, no tribunal do delírio, há espaço pra tudo — inclusive para uma peça processual de zoeira, com selo OAB do Caos e registrado na Vara da Insanidade Afetiva:

AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE GUARDA COMPARTILHADA DE BEBÊ REBORN
Com pedido de tutela antecipada e visita quinzenal com roupinha temática

Autor: Tício Cósmico, já emocionalmente apegado,
Ré: Mévia da Luz Cósmica, autodeclarada mãe afetiva do reborn “Aurorinha”

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara de Famílias Imaginárias e Situações que o CPC Jamais Ousou Prever,

O Autor vem, por meio desta, propor a presente AÇÃO DE GUARDA COMPARTILHADA, nos termos do art. 1.583 do Código Civil; dos arts. 1º, III, e 5º, VI, da Constituição Federal (princípio da dignidade do brinquedo humanizado); e na Lei da Limpeza Energética Invisível, com base nos seguintes fatos:

  1. O casal manteve uma relação intensa por dois meses e meio, período em que adquiriram em conjunto o bebê reborn “Aurorinha”, modelo Deluxe, olhos castanhos, com função chorinho e cheiro de talco da alma.
  2. Após o término, a Ré reteve a boneca unilateralmente, bloqueando o Autor nas redes sociais e impedindo o contato com a criança-vinil.
  3. O Autor apresenta fortes vínculos afetivos com Aurorinha, comprovados por fotos, vídeos, reels no Instagram e uma tatuagem no antebraço com a frase: “Filha é pra sempre – mesmo que seja de silicone”.
  4. A Ré vem utilizando a imagem da bebê reborn para autopromoção espiritual em grupos de mães cósmicas, sem autorização do Autor.
  5. Requer, com urgência, o direito de visitas quinzenais, às segundas-feiras, com permissão para trocar a roupa da boneca, fazer ensaios fotográficos e participar de chás de boneca simbólicos.
  6. Pede-se, ainda, a fixação de alimentos simbólicos (1 pacote de fralda RN por mês), a fim de garantir o sustento estético da infante.

Protesta-se por todos os meios de prova em direito admitidos, inclusive sessão de constelação familiar com participação da boneca.

Nestes termos,
Pede deferimento com urgência e sensibilidade.

Neemias Moretti Prudente
Advogado e Babá de reborn nas horas vagas


P.S.: Esta “bagaceira” é dedicada ao meu Txai Jocymar Sales, que acredita que o bebê reborn é o prenúncio do fim dos tempos. Um homem firme, sensato e visceralmente comprometido com a sanidade. Ele diz que se alguém chegar perto dele com uma boneca no colo e chamar de “meu filho”, ele já tem pronto um kit exorcismo no porta-luvas. Obrigado, Jocy, por manter o equilíbrio do universo e lembrar a todos que nem toda fralda merece ser trocada — algumas precisam apenas ser esquecidas. É ele quem está escrevendo — como quem conversa com deuses antigos enquanto folheia tratados esquecidos — um livro sobre Religiões, a ser lançado em Janeiro de 2027, do qual terei a honra de ser coautor.

Mas ó… se o mundo tá desabando, que seja com estilo, com zoeira e uma petição bem redigida na mão.

⚡ Neemias Moretti Prudente é escritor, advogado, filósofo, professor e editor-chefe do Factótum Cultural. Se perdeu entre os livros, os filmes, os boletos e os rituais de Ayahuasca. Escreve para não enlouquecer — e às vezes enlouquece para escrever melhor.

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