Por Ecos do Mundo

Nova pesquisa nacional revela que 7 em cada 10 episódios de violência doméstica ocorrem diante de outras pessoas. Em 70% deles, há crianças no local. Dados revelam quais são as consequências desse tipo de trauma.
A nova edição da Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, realizada em 2025 pelo Instituto DataSenado e pela Nexus, revela um dado alarmante: 71% das mulheres vítimas de violência doméstica foram agredidas na presença de outras pessoas — e, em 70% desses casos, havia crianças no local, em geral filhos e filhas das próprias vítimas. Isso significa que milhões de crianças estão sendo expostas à violência dentro de casa, convivendo com agressões que deixam marcas profundas e duradouras.
Apesar de presenciarem as agressões, em 40% dos episódios nenhuma testemunha oferece ajuda, o que inclui adultos que estavam no mesmo ambiente que as crianças. A pesquisa ouviu 21.641 mulheres e é a maior do país sobre violência de gênero. Esta é a primeira vez que o levantamento investigou quem presencia as agressões — e os dados mostram que o ciclo de violência atinge diretamente a infância, ampliando os danos para além da vítima.
Danos a curto e longo prazo
Pesquisas mostram que presenciar violência dentro de casa pode deixar marcas profundas nas crianças. Um estudo da Faculdade de Medicina da USP, em parceria com a Universidade de Bath e publicado no The Lancet Global Health, identificou que um terço dos diagnósticos de transtornos mentais em adolescentes está associado a traumas vividos na infância.
A análise acompanhou mais de 4 mil jovens e revelou que 81% deles já haviam enfrentado alguma situação traumática aos 18 anos, incluindo violência doméstica. Segundo os pesquisadores, experiências desse tipo afetam o desenvolvimento emocional e o funcionamento de áreas do cérebro ligadas ao humor, memória e controle dos impulsos, aumentando o risco de ansiedade, depressão, TDAH e outros transtornos ao longo da vida.
“Em resumo, é uma faixa etária crítica”, afirma o psiquiatra Elton Kanomata, do Hospital Israelita Albert Einstein. “A exposição precoce a traumas pode influenciar negativamente na saúde mental na infância e na adolescência, e isso pode aumentar significativamente o risco de desenvolver transtornos mentais ao longo da vida.”
Por isso, especialistas reforçam a importância da identificação precoce de sinais de sofrimento emocional em crianças e adolescentes, para evitar que esses impactos se agravem. São eles: alterações de humor (ansioso, deprimido, irritadiço, choro fácil), mudanças no comportamento (inquietude, agressividade, comportamentos intempestivos), alterações cognitivas (queda no rendimento escolar, desatenção, dificuldade de concentração), dificuldades sociais (isolamento, desconfiança excessiva), mudanças de sono (insônia, sonolência excessiva) e alteração no apetite (com perda ou ganho de peso).
“É muito importante a identificação precoce de sinais psicológicos, pois eles podem indicar sofrimento emocional e vulnerabilidade. Esses sinais permitem abordagens terapêuticas mais específicas e, geralmente, sem a necessidade de emprego de medicamentos”, diz o psiquiatra. Com isso, os jovens podem conseguir lidar com traumas de maneira mais efetiva e sofrer menos com o impacto desses transtornos ao longo da vida.
O que mais se sabe sobre a violência doméstica
O estudo da DataSenado e da Nexus mostra ainda que a maior parte das mulheres recorre primeiro às suas redes pessoais e religiosas:
- 58% buscaram apoio na família
- 53% recorreram à igreja
- 52% a amigas e amigos
Apenas 28% registraram denúncia na Delegacia da Mulher e 11% acionaram o Ligue 180. As comunidades de fé têm papel central: 70% das evangélicas procuraram apoio religioso. O levantamento aponta ainda que 67% das brasileiras conhecem pouco a Lei Maria da Penha, e 11% não conhecem nada sobre ela. O desconhecimento é maior entre mulheres de menor renda e escolaridade — justamente as mais afetadas pela violência. Além disso, mais da metade das vítimas (58%) vive situações de violência há mais de um ano, revelando dificuldade de romper o ciclo por medo, dependência financeira e falta de redes de apoio.






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