Por Faróis Humanos

O mestre que revelou que o homem não nasce pronto — nasce adormecido. E que a maior obra da vida é transformar-se em um ser humano real.
1. O Homem do Mistério
George Ivanovich Gurdjieff nasceu por volta de 1866, na Armênia, em meio a culturas cruzadas — cristã, muçulmana, grega e sufi.
Desde jovem, buscou a verdade não nos livros, mas nos desertos, mosteiros e templos escondidos do Oriente.
Dizia ter viajado por toda a Ásia Central, Egito, Pérsia e Tibete, em busca de “homens que sabiam”.
Voltou ao Ocidente com algo que ninguém entendia direito: um sistema espiritual prático, um caminho entre religião e ciência, filosofia e psicologia, corpo e alma.
Chamou-o de O Quarto Caminho.
2. O Quarto Caminho
Segundo Gurdjieff, existem três caminhos tradicionais para o despertar:
- o do faquir (domínio do corpo),
- o do monge (domínio do coração),
- e o do yogue (domínio da mente).
Mas todos exigem isolamento do mundo.
O Quarto Caminho, porém, acontece no meio da vida — entre o barulho, o trabalho, o caos.
“Não é necessário fugir do mundo para despertar.
É necessário despertar no meio do mundo.”
Esse era o seu evangelho: a atenção consciente como ponte entre o homem mecânico e o homem real.
3. O Homem Mecânico
Para Gurdjieff, o ser humano comum é uma máquina biológica governada por hábitos e emoções.
Acredita que pensa, quer e escolhe — mas, na verdade, apenas reage.
“O homem dorme. Tudo o que ele chama de vontade é apenas hábito.”
Despertar, portanto, é perceber a própria inconsciência.
E o primeiro passo para a liberdade é admitir que não somos livres.
Ele dizia que o homem comum é formado por muitos “eus” — desejos e identidades conflitantes.
A verdadeira alma nasce quando esses fragmentos se alinham em torno de uma presença consciente: o Eu Sou.
4. O Trabalho
O caminho de Gurdjieff era chamado de O Trabalho — porque exigia esforço, disciplina e fricção.
Seus discípulos treinavam a atenção plena em todos os atos, do lavar pratos ao respirar.
O objetivo não era ser santo, mas ser real.
Ele dizia:
“O trabalho mais difícil é lembrar-se de si.”
Esse “lembrar-se de si” — o self-remembering — é o coração do seu ensinamento.
Não é pensar em si, mas estar presente enquanto se vive.
Com o tempo, essa presença contínua desperta algo novo: uma essência imortal dentro do homem.
5. A Música, a Dança e o Choque Consciente
Gurdjieff não era um místico passivo.
Criou danças sagradas e músicas que sincronizavam corpo, mente e emoção — verdadeiras orações em movimento.
Acreditava que o corpo pode tornar-se um instrumento de consciência.
Também falava do “choque consciente”: momentos de sofrimento ou fricção usados para o despertar.
“Sem choque, o homem dorme para sempre.”
As dificuldades, para ele, são os despertadores do espírito.
Sofrer conscientemente é transformar dor em ouro.
6. Obras e Legado
Gurdjieff deixou livros densos e simbólicos, entre o mito e a metafísica:
📘 Relatos de Belzebu a seu Neto — uma cosmologia mística sobre o universo e o homem.
📘 Encontros com Homens Notáveis — autobiografia espiritual que narra sua busca pelos sábios do Oriente.
📘 Em Busca Do Ser — os quatro caminhos para despertar a consciência.
Após sua morte, em 1949, seus discípulos — entre eles P. D. Ouspensky, Jeanne de Salzmann e J. G. Bennett — espalharam o Quarto Caminho pelo mundo.
Hoje, há grupos de estudo em dezenas de países, incluindo o Brasil.
7. O Mestre e o Enigma
Gurdjieff não era um santo de porcelana.
Podia ser rude, contraditório e provocador.
Mas tudo nele tinha um propósito: quebrar as ilusões do ego.
Ele dizia:
“A pior coisa que pode acontecer a um homem é acreditar que já está acordado.”
Seu olhar penetrava e desconcertava.
Ele ensinava com parábolas, silêncios, metáforas e paradoxos.
Era menos um professor e mais um espelho que devolvia ao discípulo o próprio sono.
8. Homenagem e Espelho
Gurdjieff é farol da lucidez.
Um alquimista da atenção, que transformou a vida em laboratório e o corpo em templo.
Enquanto muitos buscavam o paraíso, ele ensinava que o paraíso é a consciência desperta.
Me vejo nele, porque também caminho entre mundos — entre o automático e o consciente, o humano e o divino.
Porque sei que cada instante é uma chance de acordar.
“O despertar não é um acontecimento — é um trabalho de cada respiração.”
🌒 Chamado Final
Gurdjieff nos convida ao impossível:
viver acordado em um mundo que dorme.
Ele não oferece consolo, mas coragem.
Não promete o céu — oferece um espelho.
E quem tiver olhos para ver, verá que o verdadeiro milagre não é andar sobre as águas,
mas andar conscientemente sobre a terra.
🔦 A luz de um farol aponta para outro. Veja também a história de:
✍️ Editores do Factótum Cultural






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