“O que aconteceu em Barbacena não foi um acidente. Foi uma política de exclusão institucionalizada.”
— Daniela Arbex

Mais de 60 mil mortos. Gente internada à força. Crianças, mulheres, homens, idosos, pessoas com deficiência, homossexuais, órfãos, pobres, alcoólatras, indesejáveis. Nenhum julgamento. Nenhuma sentença. Nenhuma chance.

Esse é o cenário real revelado no livro Holocausto Brasileiro, da premiada jornalista Daniela Arbex, e adaptado anos depois para o impactante documentário disponível na Netflix. Uma história tão perturbadora quanto essencial: o extermínio de vidas dentro do Hospital Colônia de Barbacena, em Minas Gerais — uma espécie de campo de concentração brasileiro, com métodos de tortura travestidos de “tratamento psiquiátrico”.

Documentário (Netflix, 2016)

Barbacena: a cidade que escondeu um campo de horror

O Hospital Colônia começou com um propósito nobre: cuidar de pessoas com sofrimento mental. Mas o que se viu ali foi uma degradação moral e ética absoluta, num cenário que remete ao pior do totalitarismo nazista.

  • Pessoas sem diagnóstico eram internadas por motivos banais: pobreza, gravidez fora do casamento, rebeldia, alcoolismo, deficiência, homossexualidade.
  • Choques elétricos, banhos gelados, fome, abandono e tortura eram rotina.
  • Crianças cresciam lá dentro e morriam sem sequer saber o que era o mundo.
  • Famílias eram enganadas e separadas para sempre.
  • Estima-se que 70% dos internados nunca tiveram qualquer transtorno mental.

Daniela Arbex dá nomes, rostos e histórias a esses corpos apagados. E o documentário, com imagens de época e relatos comoventes, torna tudo ainda mais insuportável — e, por isso mesmo, necessário.

Livro e documentário: jornalismo que cura a amnésia coletiva

O livro, lançado em 2013, é fruto de uma pesquisa minuciosa, sensível e respeitosa. Arbex vasculha arquivos, entrevista sobreviventes, funcionários, médicos, familiares. Ela escreve como quem carrega um fardo — mas com a missão de dar voz aos que morreram em silêncio.

Já o documentário, lançado pela Netflix, é um soco visual. Com direção precisa e montagem tensa, ele transforma páginas em lágrimas. É impossível assistir sem sentir o peso da omissão, da injustiça e da barbárie institucional.

“A diferença entre Barbacena e Auschwitz é que em Minas ninguém lembra que existiu.”

Responsabilidade histórica: uma ferida que ainda não cicatrizou

O que aconteceu em Barbacena não foi um erro médico. Foi um projeto de exclusão social legitimado pelo Estado, pela medicina da época e pela sociedade. Gente incômoda era trancada para “não dar trabalho”. Era mais barato apagar do que incluir.

O silêncio que se seguiu é parte do crime. O esquecimento é sua segunda morte.

E aqui está o ponto central: não é só sobre o passado. O livro e o documentário são um alerta brutal sobre o presente:

  • Quantos manicômios seguem existindo sob outro nome?
  • Quantas internações forçadas ainda acontecem por pressão familiar ou judicial?
  • Quantas pessoas com sofrimento mental são tratadas como “problemas” e não como seres humanos?

Lições que o Direito, a Psicologia e a sociedade precisam aprender

Para quem atua com saúde mental, justiça, políticas públicas, educação ou direitos humanos, Holocausto Brasileiro é leitura obrigatória. É um espelho do que acontece quando o saber se dissocia da ética, quando a autoridade enlouquece e a sociedade consente.

  • Para o Direito, é uma denúncia da omissão e da conivência institucional.
  • Para a Psicologia, uma ferida aberta nas práticas manicomiais.
  • Para o cidadão comum, um lembrete: ninguém está livre de ser considerado “louco” quando o sistema enlouquece.

Por que precisamos lembrar de Barbacena?

Porque o esquecimento é confortável — e por isso mesmo, perigoso.
Porque as vítimas não tiveram direito à palavra — e agora nós podemos falar por elas.
Porque a história não pode mais ser escrita só pelos vencedores — mas também pelos vencidos.
Porque o Brasil precisa olhar para suas feridas para não continuar repetindo suas violências com roupa nova.

Holocausto Brasileiro não é só um livro. É um memorial.

É um grito tardio, mas necessário. Um libelo pela dignidade humana.
E talvez, ao lê-lo ou assisti-lo, alguma parte de nós também se cure — da indiferença.

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