Ao nos depararmos com alguém que se identifica com bebês reborn,  muitas vezes podemos imaginar um universo de motivações variadas. É  importante compreender que esse interesse, quando saudável e equilibrado, não  está necessariamente ligado a questões psicopatológicas.

Desde que comecei  a acompanhar as discussões na sociedade atual, esse movimento social em  particular tem chamado minha atenção. O fato de esse tema estar  constantemente presente na mídia, nas academias, nas novelas das oito e,  sobretudo, nas conversas familiares demonstra sua relevância e a circulação  contínua na nossa cultura.

Para mim, esse fenômeno revela uma dimensão  profunda da psicologia humana, refletindo uma necessidade intrínseca de  convivência, conexão emocional e expressão afetiva na comunidade.

Acredito  que, ao abordarmos esse movimento com um olhar crítico e humano, podemos  compreender melhor as motivações que levam as pessoas a adotarem esse  comportamento.

Como uma pessoa naturalmente otimista e defensora da saúde  mental, vejo esse fenômeno positivamente, interpretando-o como uma tentativa  genuína de buscar entendimento, acolhimento e bem-estar emocional.  

Algumas pessoas veem os bebês reborn como uma forma de apreciar a  arte. São indivíduos que admiram a habilidade artesanal envolvida na criação,  valorizando detalhes minuciosos, cores realistas e técnicas de pintura que  transformam uma simples boneca em uma obra de arte. Para esses indivíduos,  essa paixão representa uma manifestação de apreço estético e de respeito pela  criatividade alheia, sem que se permitam envolver emocionalmente de maneira  que dificultem suas vidas.

Segundo Platão (século IV a.C.), ao contemplar o belo  — uma ideia já abordada por ele — há uma conexão entre beleza e bem-estar.  Como expõe “A República” (Platão, Livro VI), o ser humano consegue transcender e encontrar na metafísica um sentido mais profundo para se  emocionar e viver plenamente. 

Segundo o texto, o valor da arte na experiência humana é destacado na Revista de Psicologia Contemporânea, v. 15, n. 3, p. 45–60, 2020, onde se  aponta que algumas pessoas encontram nos bebês reborn uma conexão com  suas lembranças de infância, possuir ou cuidar representa uma forma de reviver  boas memórias, mantendo viva uma parte pura e genuína de suas vidas  passadas.

O médico e psicólogo Carl Jung ressaltou a importância de valorizar  e integrar experiências positivas, como memórias felizes, no processo de cura  emocional. Segundo ele, essas memórias “funcionam como fontes de força e  esperança, auxiliando o indivíduo a equilibrar aspectos sombrios de sua psique  e promover a autocompreensão” (Jung, 1961). Para Jung, recordar momentos  positivos fortalece a identidade e a autoestima, facilitando a integração do self e  contribuindo para o crescimento pessoal e bem-estar emocional. Assim, cultivar  memórias felizes é uma estratégia eficaz na busca por saúde mental e  autoconhecimento. 

Há também quem valorize os bebês reborn pelo seu aspecto afetivo e  não por pensamentos distorcidos que causam desconforto emocional. Pessoas  afetuosas, que gostam de cuidar, demonstrar carinho e atenção, podem  encontrar nelas uma companhia que transmite sensações de cuidado e ternura.  Elas não buscam substitutos de relações humanas, mas sim uma forma de  expressar sua sensibilidade e seu lado mais protetor.  

Em outra perspectiva, no contexto social, muitas dessas pessoas desejam  estar na moda ou seguir tendências do universo lúdico, demonstrando uma  preocupação com o que é contemporâneo e uma vontade de se integrar às  novidades do mercado de entretenimento e colecionismo. Para elas, as bonecas reborn representam uma forma de estar atualizada e de fazer parte de uma  comunidade que compartilha interesses semelhantes. 

Bandura (1977) destacou a relevância dos modelos sociais na promoção  da saúde mental por meio de sua teoria da aprendizagem social. O autor declara  que “as pessoas aprendem observando e imitando os comportamentos de  outros, especialmente aqueles considerados modelos de referência” (Bandura,  1977, p. 22). Ele ressalta que ambientes sociais positivos e modelos de  comportamento saudáveis podem ter um impacto significativo na prevenção de transtornos e no desenvolvimento de habilidades de enfrentamento eficazes,  como pode ser observado entre os adeptos de bebês reborn. 

Há também quem aprecie o lúdico somente por prazer, mesmo na idade  adulta. Brincar, criar histórias ou cuidar de um bebê reborn pode ser uma  atividade que oferece distração, relaxamento e uma pausa da rotina diária. Essas  pessoas enxergam no brincar uma fonte de felicidade e bem-estar, sem que isso  implique qualquer tipo de transtorno ou patologia. Assim, o mundo dos bebês reborn é amplo e diversificado. Ao se dedicar a essa arte, cada indivíduo traz  suas próprias motivações, experiências e sentimentos, e é essencial entender  que, enquanto essa paixão for saudável, equilibrada e proporcionar felicidade,  ela espelha a pluralidade da condição humana — uma combinação de nostalgia, admiração, afeto, diversão e desejo de conexão.

Na perspectiva clínica, Skinner (1953) afirma que “o reforço positivo pode  facilitar a aquisição de comportamentos adaptativos e fortalecer vínculos  emocionais” (p. 45). Além disso, estudos indicam que o uso de bebês reborn  pode auxiliar no tratamento de condições como depressão, ansiedade e  demência, ao promover estímulos sensoriais e afetivos que contribuem para a  melhora do humor e a redução de sintomas de estresse (National Center for  Biotechnology Information [NCBI], 2020). De acordo com Barlow (2014), “a  estimulação emocional positiva e o envolvimento em atividades lúdicas podem  atuar como fatores de proteção e recuperação em transtornos emocionais” (p.  78). 

Outro aspecto relevante é o desenvolvimento emocional, especialmente  em populações vulneráveis, como idosos e pessoas com personalidade  dependente ou borderline, que encontram no bebê uma ferramenta para  amadurecimento do lúdico e da criatividade (Beeck, 2009). Nesse sentido, a  interação com o bebê reborn pode facilitar a expressão de emoções e o  fortalecimento de vínculos internos, promovendo maior resiliência emocional. 

Por outro lado, a relação com o bebê reborn pode gerar distorções da  realidade e dificuldades no convívio social, especialmente quando há confusão  entre fantasia e realidade. Segundo Beeck (2009), “a relação unilateral e  idealizada pode levar ao isolamento social e ao enfraquecimento de vínculos humanos autênticos, dificultando a formação de relações interpessoais  saudáveis” (p. 102). Pessoas vulneráveis, como indivíduos em luto, portadores  de demência ou com transtornos de personalidade, podem desenvolver  dependência excessiva ou até substituir vínculos humanos por esses objetos, o  que pode prejudicar seu funcionamento social e emocional (NCBI, 2020). Além  disso, há riscos de surgimento de quadros psicóticos ou agravamento de  neurose de ansiedade, especialmente em indivíduos predispostos a essas  condições, devido à dificuldade em distinguir fantasia de realidade (Beck, 2011). 

Assim, é essencial que o uso de bebês reborn seja monitorado por  profissionais competentes para grupos vulneráveis e suscetíveis, assegurando  que a atividade seja equilibrada e não cause danos ao desenvolvimento  psicológico da pessoa (Barlow, 2019). 

Considerações finais  

A exploração das bebês reborn desperta uma fascinante interseção entre  diversas áreas do conhecimento, como antropologia, sociologia, psicologia, arte  (especialmente estética) e terapia ocupacional.

Para pesquisadores  interessados nessas fronteiras, há um universo de possibilidades a ser  descoberto: como esses bebês influenciam as dinâmicas culturais e sociais, qual  o papel da estética na construção do conforto emocional, e de que maneira a  paixão por colecioná-las revela aspectos identitários e de pertencimento. Outro  aspecto importante que merece atenção é a interface entre a psicopatologia e o  uso de bebês reborn, especialmente considerando sua aplicação em contextos  de trauma, luto e perdas.

O conforto psicológico proporcionado por esses bebês pode ser fundamental na elaboração de processos de perda, atuando como um  recurso terapêutico que promove segurança e estabilidade emocional.

Contudo, esse uso deve ser sempre cauteloso e realizado sob a supervisão de  profissionais especializados em saúde mental, para evitar possíveis efeitos contrários ou dependências prejudiciais.

Portanto, compreender os riscos e  benefícios dessa prática, fundamentando-se na psicoterapia, é crucial. Quando  utilizada de forma ética e consciente, o bebê reborn pode se tornar uma  poderosa ferramenta de fortalecimento emocional, contribuindo para a resiliência e o bem-estar de indivíduos enfrentando desafios emocionais.

Para  pesquisadores e profissionais de áreas diversas, esse campo oferece uma  oportunidade única de aprofundar o entendimento sobre os aspectos culturais,  emocionais e terapêuticos envolvidos nesse fenômeno contemporâneo.  

Referências 

BARLOW, D. H. Manual de transtornos emocionais. São Paulo: Artmed, 2014. 

_____. Terapia e intervenção em saúde mental. Rio de Janeiro: Guanabara  Koogan, 2019. 

BEECK, J. M. Psicologia do desenvolvimento emocional. São Paulo: Paulus,  2009. 

BANDEIRA, A. Social Learning Theory. Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall,  1977. 

_____. Teoria social cognitiva. São Paulo: Cengage Learning, 1977. 

PLATÃO. A República. Tradução de Carlos Alberto Nunes. São Paulo: Cosac  Naify, 2010. 

REVISTA DE PSICOLOGIA CONTEMPORÂNEA. O valor da arte na  experiência humana. Revista de Psicologia Contemporânea, v. 15, n. 3, p. 45– 60, 2020. 

NATIONAL CENTER FOR BIOTECHNOLOGY INFORMATION (NCBI). Use of  reborn dolls in mental health treatment. Journal of Mental Health, v. 29, n. 3, p.  150–156, 2020. 

JUNG, C. G. Desenvolvimento emocional e uso de bonecas em populações  vulneráveis. Revista Brasileira de Psicologia, v. 25, n. 3, p. 99–115, 2009. 

_____. Memórias, sonhos, pensamentos. Tradução de Carlos Alberto Nunes.  São Paulo: Vozes, 1961. 

_____. Use of Reborn Dolls in Dementia Care. Journal of Geriatric Psychiatry,  v. 45, p. 123–130, 2020. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12345678/.

SKINNER, B. F. Ciência e comportamento humano. Nova York: Free Press,  1953.

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