Por Leandro Karnal
![Qual o sentido da vida? - CVV | Centro de Valorização da Vida](https://www.cvv.org.br/wp-content/uploads/2017/10/Sentido-da-Vida.jpg)
Confesso que dirigem-me muito essa questão em palestras e redes sociais.
Tenho sempre dificuldade em dizer de forma direta que eu acho a vida extraordinária porque é destituída de qualquer sentido. Todos estranham.
Existem inúmeras construções de sentido que cada um possa desenvolver.
“O sentido da vida é amar intensamente.” “O sentido da vida é visitar muitos países e experimentar comidas”. “O sentido da vida é ser feliz.”
Todas são propostas válidas, desde que saibamos, invenções nossas, sem uma régua objetiva que valide.
Afinal, sentido é o que eu coloco como meta suprema ou como eu preencho o tempo para atingi-la?
Uma parte expressiva da reflexão filosófica e dos livros de autoajuda mira na mesma meta: afinal, existe sentido?
O filósofo Jean-Paul Sartre escrevia de forma relativamente fácil e era um intelectual popular.
Se não tivesse morrido em 1980, estaria dando palestras em empresas sobre “projeto de vida”?
Acho pouco provável, primeiro porque era pessimista, feio atrás dos seus óculos grossos, pouco sorridente e não diria para os funcionários algo que os motivasse a atingir metas.
Sim, os sentidos são aleatórios, pessoais e devem ser criados, inventados, no conteúdo positivo dos termos.
Mas façamos um exercício reflexivo:
E se o sentido que você elaborou for, digamos, pouco consistente?
E se você estiver reduzido às demandas imediatas e insuperáveis da chamada “pirâmide de Maslow”?
Respirar, ingerir alimentos, excretar e dormir.
Quatro verbos que não podem ser indefinidamente adiados ou ignorados por muito tempo.
Acordar, comer, urinar, dormir de novo, beber, dormir, dormir de novo…
É insuportável pensar que seja só isso, não é?
O sexo é vital, o instinto de reprodução é programado em quase todas as espécies, mas, sabemos bem, pode ser bastante adiado ou ressignificado.
Os animais vivem dessa forma e jamais são depressivos, entediados, entusiasmados, ciclotímicos ou algo assim.
Eles apenas agem dentro de códigos prévios e nunca perguntam pelo sentido ou, seguindo Heidegger, existem, mas não são.
“Torna-te quem tu és” é uma linda ideia de outro filósofo, Friedrich Nietzsche.
Apesar de todo esforço demolidor do alemão, tornar-se aquilo que eu sou parece implicar uma verdade densa e interna, algo que eu possa descobrir com esforço racional e biográfico.
“E se eu for nada, absolutamente nada, sem essência, sem sentido ou propósito?” A frase me conduziria à liberdade ou ao suicídio?
Gostaria de propor um desafio, Neemias!
E se em vez de você procurar na Filosofia ou no Céu o sentido último de tudo, você, hoje, apenas tomar um bom café?
E se a água do chuveiro fluir sem perguntas sobre seu corpo e você usar aquela roupa de baixo e de cima que estava guardando para uma ocasião especial?
E se olhar para as pessoas próximas com intensidade, interesse e zelo?
Se, seguindo certa névoa budista, você não perguntar pelo ponto final ou inicial de tudo, todavia entregar-se ao ponto do agora, o único sobre o qual você tem certo controle?
E se a falta de qualquer origem e de qualquer destino supremo for, em si, um bom sentido libertador que faz o aqui e agora fascinantes? Eis uma experiência para hoje.
LK e Equipe K