Qualquer confusão entre acusação e julgamento é prejudicial à imparcialidade, diz ‘pai’ do garantismo penal

Para italiano Luigi Ferrajoli, Operação Mãos Limpas teve excessos, mas parece modelo perto da Lava Jato
Considerado o “pai” do garantismo penal, o jurista italiano Luigi Ferrajoli, 79, diz que deve haver uma separação radical entre o órgão que acusa e o que julga o réu.
A indevida confusão entre as duas esferas tem sido alvo de críticas, no Brasil, tanto no inquérito das fake news, que mira bolsonaristas, quanto nas ações da Lava Jato, que levaram à condenação ode políticos como o ex-presidente Lula.
No caso das fake news, especialistas dizem que, como o inquérito foi instaurado, de ofício, pelo próprio STF (Supremo Tribunal Federal), isto é, o órgão julgador, a separação entre o órgão que investiga e o que julga estaria comprometido.
Já na Lavo Jato, mensagens vazadas pelo site The Intercept Brasil sugerem que havia colaboração entre os procuradores da força-tarefa – a acusação, portanto – e o então juiz Sérgio Moro.
Ferrajoli, aliás, crítica os julgamentos conduzidos por Moro e diz que, em qualquer outro país, o comportamento do magistrado justificaria sua suspeição.
O Jurista reconhece que a Mãos Limpas – operação deflagrada em 1992, na Itália, que revelou um grande esquema de corrupção e é frequentemente comparada à Lava Jato – teve “excessos anti-garantistas”, mas diz que ela parece um modelo de garantismo se comparada com os processos que resultaram na condenação de Lula.
O garantismo é uma corrente jurídica que prega o respeito máximo às garantias processuais, a fim de coibir arbitrariedades judicias e, desta forma, de proteger os réus – que são considerados inocentes até o trânsito em julgado da sentença condenatória.
É a principal teoria por trás de diversas discussões jurídicas travadas no Brasil recentemente. Desde a prisão após a condenação em segunda instância até quebras de sigilos, passando por conduções coercitivas do réu e prisões preventivas, tudo isso tem o garantismo (ou a falta dele) como base teórica.
O conceito foi explorado por Ferrajoli na obra “Direito e Razão – Teoria do Garantismo Penal”. No prefácio da primeira edição italiana, publicada em 1989, o filósofo Norberto Bobbio diz que o “garantismo é um modelo ideal, do qual nós podemos mais ou menos aproximar”.
Em entrevista à Folha por email, Ferrajoli rebate as críticas de que o garantismo pode ser um obstáculo à condenação de culpados.
“É um obstáculo à condenação de bodes expiatórios inocentes, certamente capazes de satisfazer a demagogia populista, mas certamente não é um obstáculo à responsabilização penal daqueles que realmente cometeram crime”.
Na entrevista, Ferrajoli fala ainda sobre temas como abuso de autoridade, prisão após condenação em segunda instância, tribunal do júri e endurecimento das penas.
Acesse a entrevista, na íntegra. Clique aqui.
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