Por Gisele de Souza Gonçalves

Passamos da metade de dezembro e vem aquela constatação: “acabou o ano”. E então sabemos das muitas coisas que precisamos organizar para o Natal, depois, para o Ano Novo e, antes disso, a faxina tão planejada. Enfim, muitas demandas e poucos dias para tanta coisa arrumar.
A sensação é a de que precisamos ajustar, limpar, organizar tudo aquilo que não foi possível durante o ano e otimizar o pouquíssimo tempo que falta para concluir o que projetamos.
Eu sempre imagino uma ampulheta me pressionando para realizar tanta coisa, que eu sei que não farei como pretendo, por conta da quantidade delas, por causa da assembleia de dores que se reuniram justamente neste recesso – dores pelos exercícios físicos, dor de garganta, dores pelos repetidos serviços domésticos, dores na alma -, enfim, à medida que percebo tudo aquilo que preciso fazer e começo a realizar as atividades da lista, muitos empecilhos surgem simultaneamente para que eu as abandone.
Então eu permito um tempo para mim e penso: por que eu preciso realizar, em tão pouco tempo, essa imensa lista de coisas que eu não desisti de fazer, mas que durante a rotina do trabalho fora e dentro de casa, eu não consegui?
Que voz é essa que me pressiona, me incomoda e me questiona por que há uma longa lista a fazer e eu me puno por não tê-la concluído?
Bom, eu queria muitas coisas: arrumar os armários, orientar a organização do quarto da minha filha, organizar a estante de livros, eu queria fazer passeios com minha filha, também queria ler muitos livros que estão em uma pilha me aguardando, eu, sinceramente, queria dormir mais também…
Vejam, a minha lista é confusa, ao mesmo tempo ela tem trabalhos demorados e que exigem paciência – orientação do quarto da filha é um dos que mais me exige -, há momentos só meus, há lazer e descanso. Sejamos sinceros, vocês também sabem que eu não vou concluí-la, certo?
E essa é a sensação do fim de ano, como se eu fosse uma supervisora de mim mesma e percebesse que não fiz o que era planejado. Todavia, há uma analista humanizada que diz “por que você acha que precisa fazer tudo isso até o dia 31?”. Eu prefiro essa com certeza.
Então eu a ouço, tento buscar os motivos que me levam a acreditar nessa obrigação.
Por que temos que ser produtivos sempre? E por que trabalhamos tanto fora de casa a ponto de tanta coisa ficar sempre para depois, e esse depois ser justamente o momento que temos para estarmos descansando?
Sugestão: pegue a sua lista e carimbe “por que preciso fazer tudo isso”? É o que farei na minha lista, como não tenho carimbo vou imaginar um, assim como imagino a ampulheta que me pressiona.
Deixo aqui uma citação de Ailton Krenak para pensarmos sobre nossas listas: “A vida é tão maravilhosa que a nossa mente tenta dar uma utilidade a ela, mas isso é besteira. A vida é fruição, é uma dança, só que é uma dança cósmica, e a gente quer reduzi-la a uma coreografia ridícula e utilitária” (Krenak, 2020, p.108).
Que a gente possa aprender a viver essa dança maravilhosa sem o peso das listas utilitárias, substituindo-as por caminhos mais leves que não as acumulem.
Boas festas, boas leituras, boas danças na vida!
Referências
KRENAK, Ailton. A vida não é útil. 1ª ed. São Paulo: Companhia das letras, 2020.

Gisele de Souza Gonçalves, mãe, professora da educação básica, doutora pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE).
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