Escrever Para Não Enlouquecer – Por Neemias

Se não deu certo, apague e recomece. Esqueça o que ficou. Esqueça a culpa. A falta de plano. Esqueça a dúvida. O que foi quase engano. Apague e recomece. É sempre hora de mudar, de virar a página e se reinventar. Mesmo que doa, aprender não é um processo à toa – Fernanda Mello.
A culpa já me consumiu muitas vezes. Ela vinha como um fogo lento, queimando por dentro, me lembrando de cada erro, de cada plano que não deu certo, de cada palavra que eu gostaria de não ter dito. E eu carregava esse peso como se fosse uma sentença.
Por muito tempo, acreditei que a culpa era prova da minha falha. Hoje entendo que ela é, na verdade, prova da minha humanidade. Errar me mostrou não só meus limites, mas também me ensinou a olhar para o outro com mais empatia. Se eu falhei, todos podem falhar. Se eu errei, todos erram. A culpa, quando atravessada, se transforma em compaixão. Ela me ensinou a não julgar com dureza, porque sei o quanto dói carregar os próprios fardos.
Muitas vezes, o que me atormentava não era apenas a culpa, mas também a falta de plano. Eu desenhava a vida em mapas perfeitos, acreditando que tudo seguiria um roteiro claro. Mas a vida não respeita mapas. Ela vira a esquina de repente, desmonta nossos planos e nos coloca diante do improviso. No começo, vi nisso fracasso. Depois compreendi: improvisar também é criar. Não ter o caminho definido não significa estar perdido — significa estar aberto ao inesperado.
A dúvida também sempre esteve comigo. Quantas vezes fiquei paralisado, olhando para o abismo da escolha, com medo de errar de novo. A dúvida nos consome porque queremos a certeza que nunca virá. Mas descobri que a dúvida só se vence caminhando. O passo dado é sempre melhor que o passo paralisado. E mesmo quando escolhemos o caminho “errado”, descobrimos que ele também nos leva aonde precisávamos chegar.
E quantos “quase enganos” já vivi? Situações que eu tinha certeza de serem fracassos absolutos, mas que depois se revelaram mestres disfarçados. O que parecia ruína era, na verdade, tijolo da construção de quem sou hoje. A vida tem essa ironia: nos ensina pelo tropeço, pelo inesperado, pela curva que parecia nos afastar do destino, mas que, no fundo, nos aproximava.
Hoje, olhando para trás, percebo que cada erro, cada culpa, cada dúvida, cada plano desfeito e cada engano me trouxeram até aqui. E aqui não é o fim — é o exato lugar onde eu precisava estar para continuar.
Recomeçar não é esquecer o que passou. É carregar a lição sem carregar o peso. É transformar a culpa em compaixão, a dúvida em coragem, a falta de plano em criatividade, o erro em sabedoria.
E talvez esse seja o maior presente da vida: a chance de recomeçar quantas vezes forem necessárias. Recomeçar não nos faz fracos, nos faz humanos. E, a cada recomeço, seguimos em frente mais fortes, mais conscientes e, sobretudo, com mais amor pelo outro — porque sabemos que ele também carrega as mesmas dores, culpas e dúvidas que nós.
A vida não exige perfeição. Ela exige movimento. Por isso sigo, e convido você a seguir também. Porque, no fim das contas, estamos todos aprendendo. E o que hoje parece ruína, amanhã pode se revelar raiz.
🌿 Carta ao leitor
Se você está lendo isso agora e sente o peso da culpa, da dúvida ou dos planos que não deram certo, respire. Você não está sozinho. Todos nós erramos, todos tropeçamos, todos carregamos marcas que gostaríamos de apagar. Mas a vida é generosa: ela sempre oferece novas páginas, novos caminhos, novas chances.
Não se cobre perfeição — se permita movimento. A vida não é prisão – é processo. Não se culpe para sempre — transforme a dor em aprendizado. Olhe para si com compaixão, e olhe para o outro com ainda mais amor, porque ele também está tentando, como você.
Recomeçar não é fracassar, é viver. Então apague o que precisa ser apagado, guarde a lição e siga. A vida acontece no passo seguinte. E cada passo, por menor que pareça, já é vitória. 🌿✨
Na mesma medida em que recomeçar é viver, este texto também se conecta com outras reflexões minhas: em “O Processo de Individuação: Minha Jornada Entre Luz e Sombra”, compartilho como cada erro e cada recomeço são parte da travessia rumo ao autoconhecimento, onde a sombra revela a luz que carregamos. Já em “Escrever é um Ato de Magia”, mostro que transformar dor em palavra é uma forma de feitiçaria sagrada — o verbo que cura, que ressignifica e que liberta. Esses três pontos se encontram em um só caminho: recomeçar, individuar-se e escrever são faces da mesma magia, a de se reinventar a cada passo.
E não se esqueça: Todo sábado, nossa coluna “Escrever para Não Enlouquecer” fala sério — mas só porque o universo exige equilíbrio. Segunda a gente volta com humor para os dias difíceis.

⚡ Neemias Moretti Prudente é escritor, advogado, filósofo, professor e editor-chefe do Factótum Cultural.






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