por Adriano Nicolau da Silva

Sim, estava quase enlouquecendo com os vários compromissos do dia. A  sua angústia é pensar na possibilidade de não conseguir realizar todas as tarefas  do dia anterior. Um forte sentimento de desânimo e ansiedade tomou conta do  professor Martins. A sua esperança era aguardar avidamente as quinze horas,  intervalo onde trabalhava durante o dia, no setor de recrutamento, seleção e  treinamento de uma empresa renomada do ramo de entretenimento da capital e  à noite ministrava aulas na universidade com o tema “gerenciamento do tempo”. 

Às quinze horas, passou a ser o momento mais importante nos últimos  anos. Aprendeu a parar tudo e, não fazer nada, apenas descansar a mente.  Permitiu-se, nos prazeres do processo mental de contemplação, esvaziar a  mente e deixar fluir. Tal situação é semelhante entrar em uma floresta e ver na  natureza, os pássaros cantando e saltitando com o nascer do sol nas manhãs  frias ou as flores se alegrando com o beija-flor. Sim, ter a capacidade mental de  visualizar o todo, constituído pelas partes, como nos ensina a psicologia da  Gestalt. Sair do especializado e estimular o lobo frontal do cérebro para receber  os benefícios da criatividade e espontaneidade. 

Domenico De Massi, na década de 1990, autor do livro, “O Ócio Criativo”,  ressaltou a importância das pausas para aumentar a produtividade e, ao  contrário, o conceito de trabalhar muitas horas consecutivas tem sido discutido  por economistas e profissionais ligados ao tema. Um estudo feito por John  Pencavel com trabalhadores manuais em 2014, sinalizou que a produtividade  diminui após 55 horas semanais. Erin Reid, professora da Questrom School of  Business University descobriu, em sua pesquisa, que consultores ao  trabalharem 80 horas por semana, apenas fingiam fazer isso.  

É importante sair das demandas cerebrais que prezam pela formalidade  e racionalidade, aguçar o hemisfério da criatividade e induzir a sinergia do corpo  com a mente facilitando o bem-estar emocional. Este é o momento de refletir  sobre as diversas possibilidades dos encontros sinápticos, dando origem as ideias e imaginações que fortaleceram os laços estabelecidos por uma mente que funciona buscando se adaptar às demandas motivacionais, ambientais e  profissionais.  

Sim, acreditamos que o processo de transformação em uma vida  significativa é encontrado no momento preciso em que o relaxamento profundo  e o esvaziamento da mente acontece. Tudo flui na possibilidade de entender que a dor e o prazer, a serenidade e a preocupação, assim como o pensar, constituem em estado nulo de absoluta inércia no tempo e no espaço.  Compreender que todas as coisas estão emaranhadas e enamoradas no  silêncio, ter uma sensação de liberdade e felicidade são importantes na criação  de um universo mental brilhante.  

Os grandes gênios da humanidade souberam usar o ócio como exercício  criativo. Carl Gustav Yung costumava caminhar à beira de um lago em sua  residência para pensar em seus pacientes, Martin Heidegger ficou em uma  cabana, isolado do mundo por um tempo, para escrever a obra Ser e Tempo e  Imanuel Kant, diariamente na hora do almoço, fazia uma caminhada para se  recompor da tensão das aulas ministradas e o que ele havia escrito pela manhã.  

Atualmente com base na Neuroeducação algumas Instituições de trabalho  e ensino pelo mundo aderem à filosofia de parar por alguns minutos, dedicando  esse tempo ao descanso, relaxamento e ao ócio criativo. Estão percebendo o  efeito positivo sobre os colaboradores e alunos, relacionados à produção, bem estar coletivo e nas respostas cognitivas. Isso pode ser explicado pelos diversos benefícios adquiridos, tornando-os mais relaxados, intuitivos, criativos,  espontâneos, desarmados, em relação aos pensamentos rígidos, favorecendo o “insight produtivo” estimulado por experiências do ócio criativo. Na  Neuroeducação, o ato de pensar é considerado uma representação neural que  forma um modelo mental para a organização de ideias, o planejamento, definição  de estratégias, formulação de hipóteses e resolução de problemas (COELHO,  2016). 

De acordo com Alencar (1993, p. 4), “a etimologia da palavra criatividade  está relacionada com o termo criar, do latim creare, que significa dar existência,  sair do nada, estabelecer relações até então não estabelecidas pelo universo do  indivíduo, visando determinados fins”.

O cérebro funciona, mesmo quando está em repouso, na elaboração ou  criação de algo, apresentando-se consciente ou inconscientemente de forma  simbólica, como um filtro de barro purificando as impurezas da água, facilitando  o engajamento das decisões e nas soluções de problemas que se apresentam  em situações complexas. 

É fundamental oferecer à mente o que ela precisa, pausar é uma atitude  benéfica por oferecer conexões neurais e preencher as lacunas com novos  esquemas mentais, proporcionando a geminação de projetos de longo prazo,  que possam surgir na ociosidade ou em certa atividade de lazer em momentos  de relaxamento. 

Devido ao fator social, familiar e cultural, ficar no ócio, mesmo que em  alguns momentos do dia, é coisa de “vagabundo”, mas, a ciência vem  apresentando resultados otimistas ao se permitir desligar dos vários estímulos  recebidos diariamente. Ao contrário do estímulo constante, como treinar na academia para ganhar músculos, trabalhar o tempo todo tendo um salário bom ou ler compulsivamente para adquirir informação, não favorece o conhecimento  e sabedoria, como aponta a Neuroedução. 

Você tem um tempo para ter tempo? O homem, em suas potências, percebe que toda a evolução, seja na biologia, tecnologia, engenharia, medicina,  necessita de grandes ideias para promover a qualidade, que surgem a partir do  pensamento criativo e espontâneo, sem pressão imposta por qualquer outro  compromisso. É possível, no futuro da humanidade, vislumbrar uma perspectiva  de gastar menos tempo no trabalho formal e investir mais na ociosidade?  

Portanto, é comprovado pela história humana, que chegamos onde  estamos e chegaremos em um mundo melhor através da mente, com múltiplas  possibilidades a partir do empreendedorismo para pensar o novo, o bom, o belo  e o útil, facilitando a vida de todos.  

E o professor Martins, o que faz agora? Está sendo homenageado por  seus alunos que o escolheram para representá-los como inspiração profissional.  Provavelmente, amanhã às quinze horas o professor não fará nada, deixará a  mente em repouso e no ócio criativo para continuar com a sua vida abençoada  com gratidão.

Referências

Alencar, E. S. (1993). Criatividade. Editora Universidade de Brasília. 

COELHO, Antônia Ediele de Freitas. Desenvolvimento de Habilidades  Cognitivas em um curso de férias: a construção do conhecimento científico  segundo a Aprendizagem Baseada em Problemas. (Dissertação) Mestrado em  Educação em Ciências e Matemáticas. Belém (PA). Universidade Federal do  Pará (UFPA). 101f, 2016. DE MASI, Domenico. O Ócio Criativo. Editora Sextante, 2001.

Adriano Nicolau da Silva, Psicoterapeuta, Neuropsicopedagogo e Neuroeducador. Graduado em Psicologia e Filosofia. Especialista nas áreas de educação e clínica. Uberaba, MG. E-mail: adrins@terra.com.br. Colunista do Factótum Cultural.

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