
Todos temos amigos e parentes com algum traço das redondezas das zonas cinzentas da alma: depressão, ansiedade extrema, bipolaridade, agorafobia e outros males.
E para que todas sejam superadas, precisamos tratar uma outra, primordialmente: a psicofobia.
Psicofobia é o preconceito com questões psíquicas.
Em geral, temos absoluta compreensão com alguém que tosse sangue.
Mas raras vezes entendemos os cérebros que estão sem fôlego, e que engolem angústias absolutas e maiores do que a mais forte das vontades.
A medicina psiquiátrica cresceu muito e, hoje, traz novas concepções sobre o complexo mundo da nossa mente.
Há duzentos anos, o doutor Philippe Pinel (1745-1826) libertou doentes das masmorras individuais (mentais) e sociais (preconceito).
Ele insistia que os transtornos psíquicos eram, enfim, doenças. Lutou muito em sua época.
O mundo viu surgir novas correntes de conhecimento – entre elas, a do doutor Antônio Egas Moniz (1874-1955), que avançou na técnica da arteriografia cerebral e ganhou Prêmio Nobel.
Diante de casos graves de pacientes agressivos com alterações de comportamento, o médico desenvolveu uma técnica de intervenção chamada leucotomia pré-frontal.
O resultado era um paciente dócil, sem agressividade e, na maioria das vezes, sem vontade própria.
A técnica já foi abandonada como medida psiquiátrica, mas deve ser entendida como uma resposta efetiva em uma época sem medicamentos muito eficazes a pacientes com riscos graves – de homicídio ou suicídio, por exemplo.
Pessoas com especificidades comportamentais já foram exorcizadas, presas, lobotomizadas e, geralmente, marginalizadas como constrangedoras para a família.
Depressão, por exemplo, é quase sempre vista como falta do que fazer, incapacidade de se ocupar ou simples “frescura”.
Adoramos pessoas do passado que produziram muito (obras de arte, feitos históricos) e que eram atormentadas por pensamentos fixos ou melancolias graves.
É fácil elogiar Fernando Pessoa ou o grande Van Gogh ou Michelangelo, todos acompanhados de patologias psíquicas atormentadoras.
Difícil é acolher o parente, amigo ou colega de trabalho que sofrem igualmente.
Eu já tive dificuldades para entender comportamentos ditados por algum transtorno e precisei ler muito para deixar de pensar de forma equivocada sobre eles.
Pude entender que eu me levantava naturalmente todas as manhãs e ia pela rua observando o dia. Mas entendi que há pessoas para quem cada dia é um peso insuportável, e sair do quarto, uma luta vencida com um esforço enorme, e, amiúde, uma derrota avassaladora.
Em tempo, gostaria de compartilhar uma reflexão:
Hoje pela manhã, tomei uma dose de estatina para controlar meu fígado, que é entusiasmado na produção desenfreada de colesterol.
Iniciei o dia controlando o desvario de um órgão meu.
Sou uma pessoa normal, porque meu mal não provoca tiques, movimentos bruscos ou frases inadequadas. Não inviabiliza minha atividade mental ou física cotidiana.
No entanto, se ao lado da estatina eu tomasse um antidepressivo, algumas pessoas diriam que devo estar “desocupado” ou “sem Deus no coração”.
Depressão e colesterol, hoje, podem ser controlados.
O preconceito é que continua uma doença complicada.
LK e Equipe K.






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