por Leandro Karnal

Romeu e Julieta, Benjamin West (1778)

Um jovem estudante de História aprende logo que a maneira como lemos o amor tem raízes concretas no passado.

Logo, o amor não possui essência atemporal.

As canções de menestréis medievais, a idealização de Beatriz por Dante em Florença e, acima de tudo, o Romantismo dos séculos XVIII e XIX foram vigas mestras para que se criasse uma gramática do amor como nós o entendemos.

A sociedade europeia inventou o vocabulário do amor.

Os autores naturalizaram a idealização da pessoa amada e a ideia de que a completude só existiria na presença dela ou dele.

Mais: cria-se o desejo por uma infecção perturbadora que arrasa com a racionalidade.

Mas, tudo então seria apenas convenção social?

Não é meu objetivo contestar o amor, Leitor.

Quero formular uma reflexão que não é unânime entre historiadores.

Vamos à reflexão? 

Existe o desejo sexual. Os hormônios que ele dispara no corpo são quimicamente detectáveis.

Não se trata de um delírio, é um fato biológico.

A partir disso, há as convenções sociais.

Em uma sociedade na qual os códigos moral e religioso estabelecem regras claras, o sentimento sexual será sentido como ruim, incômodo ou perverso. 

Nesse sentido, onde floresce o discurso do amor e da paixão como referência cultural, é comum que se pergunte aos jovens por quem estão apaixonados.

Os filmes e os livros nos vendem que o amor vence todos os obstáculos e dá sentido à existência.

Agora vem a pior de todas as criações culturais:

a de que existe uma cara-metade, uma alma gêmea, um ser perfeito que se adapta, convexamente, ao meu côncavo.

Tal encaixe mágico ganha tons de destino: o formato das peças foi preparado há muito. 

Assim, o desejo sexual (que já passa por mediações culturais enormes) vai sendo associado a uma paixão específica.

Muitas sociedades tratam o campo erótico de outra forma e entendem o casamento como um contrato jurídico e social, no qual a ideia de paixão nem seria desejável.

O que faria um matrimônio durar não seria o amor permanente, todavia a proximidade de formação ou de renda, e a capacidade de gerar herdeiros que assegurarão o nome da família.

O casamento não seria uma escolha de indivíduos, mas um arbítrio social.

Os arranjos matrimoniais de muitos hindus ou religiosos tradicionais falam de uma espécie de sociedade harmônica – contexto em que a harmonia implica coisas muito racionais, evitando o fogo da paixão.

Desconfio muito do amor inflamado, do amor que não existe sem a outra parte.

Confio na relação amorosa que desafia, que aumenta minha consciência, que me estimula a alcançar mais do meu potencial e explorar mais o mundo.

Gosto do amor-desafio que fala de um “Nós” sem suprimir o “Eu” e o “Tu”, que cresça junto e instigue a ser cada vez mais.

E que, por força da convivência e das conversas mútuas, mostre meus pontos cegos. 

A convivência íntima do amor, o contato dos corpos, o cotidiano que derruba cenografias e formalidades: tudo pode ser uma ferramenta extraordinária de conhecimento de si e do mundo.

Minha ideia de amor não é melhor ou pior do que qualquer outra. 

Amor é exercício e vontade de ultrapassar nossa infantilidade estrutural.

Não há damas encantadas no lago, não há cavaleiros de armadura reluzente, nunca houve uma alma gêmea, jamais um amor redimiu alguém.

O amor real é uma disposição interna que vive na prática diária.

#RecadoDaEquipeK

Família.

O que essa palavra significa para você, Leitor?

Existe uma definição tradicional de família? Qual é a cara da família brasileira?

São muitas as composições: mães-solo, avós e netos, famílias sem filhos, filhos sem pais, dois pais, duas mães…

No próximo episódio do Universo Karnal, o professor Leandro Karnal revisita o conceito da “família de comercial de margarina” e conversa sobre os diversos formatos e configurações que sempre foram não apenas possíveis, mas parte da nossa sociedade.

Para se aprofundar no tema, o professor Karnal recebe a cantora Karol Conká.

Criada em uma família longe da “tradicional”, ela conta como foi a vivência em um ambiente marcado pela violência e escassez. Também compartilha sua experiência como mãe-solo.

É possível ressignificar, com as próximas gerações, as construções familiares?

Nosso encontro, você já sabe:

 Sábado, 20/08, às 23h
Na CNN, pela TV, ou pelo YouTube da CNN Soft.

Um final de semana com muito amor!

LK e Equipe K.

Deixe um comentário

Tendência