Por Gisele de Souza Gonçalves

Quatro meses de distanciamento, vários contaminados e, até agora, no Brasil, quase 80.000 mortes. Alguns sentem, outros relativizam.
Eu lembro dos versos de Carlos Drummond:
Enquanto no mundo tem
gente pensando
que sabe muito,
eu apenas sinto
muito”.
Sinto muito pelos que se foram, pelos que estão sofrendo e, depois de um tempo, passei a sentir por aqueles que não se importam. Afinal, é preciso sentir muito pouco por si e pelos outros para não se importar com o significado disso tudo.
Sei também que é necessário mais que consciência para distanciar-se, é preciso ter condições para ficar em distanciamento: moradia, condições financeiras, saneamento básico, um lar minimamente harmonioso (nem sei se cabe tal advérbio de modo junto a este adjetivo, estou aqui pensando e continuarei a pensar sobre a harmonia e sua plenitude).
Assim pensar traz muitos sentimentos, entre eles uma certa angústia, a qual deve estar não só por aqui, mas em muitas pessoas que, como eu, pensam demais no amanhã e nas próximas vítimas dessa pandemia e suas consequências – muito mal entendidas por tantas pessoas.
Entre nós, alguns ou muitos podem ter condições para aguentar mais dias em quarentena: escrevendo, lendo, estudando, limpando, cozinhando, assistindo, amando, aprendendo, ensinando, pensando…
Esses tempos nos fazem pensar sobre nossas prioridades, nosso modelo econômico, nossos valores. Depois que isso passar, qual é o caminho a seguir? O mesmo? Talvez esteja chegando o momento de buscar o que realmente importa para nossas vidas, mas para que elas tenham melhor qualidade e também sigam em uma sociedade justa.
Distanciar-se pode ser um exercício para nos entendermos melhor, e que triste vivermos em uma sociedade tão socialmente desigual, onde só alguns de nós poderão distanciar-se em boas condições. Outros estarão se arriscando nas ruas e, ainda mais cruel, em suas próprias casas.
Que este tempo nos possibilite tomar distância de atitudes egoístas, situações tóxicas e de tantas desnecessárias circunstâncias que nos fazem mal.
Distanciar-se pode nos mostrar o que realmente importa depois que isso acabar. Como? Não sei ao certo, apenas penso e compartilho aqui as tantas dúvidas da quarentena.
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Gisele de Souza Gonçalves. Professora e Doutoranda pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Mãe.
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